por Rodrigo Vianna
A tática foi muito clara: de manhã, manifestações fracas Brasil afora (com exceção de Belo Horizonte e Brasília) serviram pra Globo fazer o “esquenta” para a tarde.
O que interessava era um “show” na tela, pra animar a paulistada a sair de casa. O Esporte Espetacular da Globo era interrompido a cada dez minutos para “giros de repórteres”. O âncora Alex Escobar (aquele que Dunga humilhou em 2010 - “tu és um cagão de merda”) tinha a frase pronta pra chamar as entradas ao vivo: “vamos acompanhar as manifestações pela Democracia, contra a corrupção e contra Dilma”.
No Rio, três repórteres ao vivo. Conheço todos eles, devem estar envergonhados do que foram obrigados a fazer. Frases ensaiadas: “muitas famílias, protesto pacíficos, camisas amarelas, famílias inteiras.” Ops, mas atrás do repórter passa um rapaz com cara de ódio, e a foto do Bolsonaro estampada na camiseta. O câmera, esperto, desvia para um plano geral.
Números no Rio. “Os manifestantes falam em cem mil pessoas, mas a PM diz que são 15 mil“. O diabo é que esqueceram de combinar com o diretor de TV, que tasca um plano aberto da avenida Atlântica. Eram 5 mil pessoas, no máximo. Entra matéria (excelente, por sinal) sobre Jairzinho e a Copa de 70. “Noventa milhões em ação…”.
Mas Escobar chama a rua de 2015, de novo: outra repórter, agora do alto de um prédio na avenida Atlântica. Pior ainda: tá na cara que está vazio. E a jornalista comete ato falho glorioso: “muitos cartazes mostram Contentamento com Dilma”. Ops.
Jornalistas da Globo estavam instruídos para chamar as manifestações como “ato pela Democracia”. O diabo são as imagens ao vivo, fora de controle. Ao fundo, um cartaz pede “intervenção militar já”.
No Rio, apareceram suásticas e cartazes pedindo “intervenção militar”. De Belo Horizonte, imagens de mais gente nas ruas. Mas parecia que ali a Globo estava menos preparada. Repórter fez entrada sóbria, não precisa apelar. Discrição mineira.
Brasília também: bastante gente. Mas não as “40 mil pessoas” que a Globo comprava como verdade. O Plano aberto desmentia a narrativa montada por Ali Kamel.
Fora do circuito Rio-Brasilia, o Escobar sofria mais. Ele chama Aracaju, e a moça não percebe que já está a vivo. A repórter grita pra meia dúzia ali na frente: “canta o hino, canta o hino”. O aúdio vaza, o povo xinga Dilma. De repente, ela percebe a gafe, fala um pouco, e o povo obediente começa o hino.
A Globo está no comando. Um cartaz erguido diz: “FFAA salvaram o Brasil em 64″. Parceria bonita essa!
Fortaleza entra pela segunda vez e…. Surpresa: “os manifestantes já se dispersaram“, diz o repórter meio envergonhado. Rua vazia.
O mais constrangedor: entrada de Ribeirão Preto. E a repórter: “muita gente nas ruas contra a corrupção, são 30 mil pessoas”. As imagens mostravam ruas quase vazias…
Belém também: pouca gente.
Volta pro Rio. A classe média chega ao fim de sua gloriosa marcha na manhã ensolarada. O local escolhido para o “gran finale”? Copacabana Palace – símbolo da aristocracia decadente carioca, símbolo das lilys e blochs com seu dinheiro escondidinho na Suíça.
Ali Kamel passou a manhã tentando insuflar os números, encher a bola da manifestação.
Nesta manhã de domingo, a Globo promoveu um “DiretasJá” às avessas (para os mais novos: em 1984, milhares foram as ruas pedir a volta à Democracia; no dia 25 de janeiro de 84, havia 300 mil na praça da Sé, e a Globo noticiou como ‘festividades pelo aniversário da capital paulista”; Ali Kamel escreve artigos até hoje para negar que Globo tenha manipulado 1984, assim como nega que haja racismo no Brasil).
Aliás, nas imagens de Salvador (a Globo falou em 4 mil manifestantes no Farol da Barra, a imagem mostrava uns mil no máximo) chamava a atenção a ausência de negros. “Parecia Blumenau”, escreveu um internauta. Peraí: nas manifestações do Ali Kamel não há racismo. Esse é o Brasil branquinho que está nas ruas…
E segue Escobar, mais entradas, mais vivos… A ideia era animar os paulistas de classe média – que acordam tarde e gostam de aumentar o barrigão em festins gastronômicos nas padarias, nas manhãs de domingo.
Vendo as imagens na Globo, centenas botaram suas camisas amarelas e foram pra Paulista – onde certamente o ato seria grande.
Na GloboNews, os comentaristas jogavam junto com os manifestantes. Mas havia dissonâncias. Um apresentador pergunta a Cristiana Lobo: ‘as manifestações contra Dilma no Nordeste foram só em bairros ricos – Boa Viagem no Recife, Farol da Barra -você acha que o PT vai explorar isso”. E a Cristiana: “veja bem…”
Diretasjá às avessas, para insuflar São Paulo contra Dilma. O Brasil repete 1954 e 1964.
Dilma, se ainda tiver um pingo de sangue brizolista nas veias, enfrenta a Globo agora. A Globo é o centro do golpe. Põe gente nas ruas, sim – especialmente em São Paulo, Brasília. No Rio, põe menos. A Globo tem força, mas o #globogolpista e o #famíliaMarinhonoHSBC comandando as redes sociais mostram que a direita não vai dar um passeio.
(relato provisório, escrito antes da manifestação em São Paulo)
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