A cara da mulher que atacou o senador Eduardo Suplicy na Livraria Cultura espalhou-se pelas redes sociais e é o espelho da sociedade brasileira atual. A primeira reação a ela é de ódio profundo. Mas basta uma pequena reflexão para saber que não é ela, uma pobre coitada. Aquela figura horrenda, berrando como uma harpia da mitologia chocou menos pelo que ela é, mais pelo que passou a simbolizar: o quadro político atual, o fracasso da elite brasileira, em todos seus ângulos – político, empresarial, intelectual, jornalístico – ter permitido que a decadência da política abrisse espaço para o protagonismo do imbecil coletivo.
Nas redes sociais de esquerda ouviam-se brados de vingança contra a figura, usando o mesmo tom vociferante da direita contra arroubos de esquerdistas.
Tempos atrás a Lava Jato mandou à prisão uma cunhada de tesoureiro do PT meramente porque sacou dinheiro em um caixa eletrônico. A reação contrária foi exigir que a mesma PF prendesse a esposa de Eduardo Cunha.
Nesse ódio sem quartel, direitos individuais, abusos de autoridades, golpismo escancarado, tudo é relevado com receio de encarar a grande besta: o imbecil coletivo.
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Esse ódio exacerbado reflete algo mais profundo: a falta de um projeto de país ou, no mínimo, de sinais de que o país pode começar a andar. Só que o primeiro passo é da presidente da República que, até agora, não manifestou o menor gesto em direção à normalização econômica.
Ontem, na cerimônia de premiação das Empresas Mais Admiradas, da Carta Capital, o novo Ministro-Chefe da Casa Civil Jacques Wagner fez um apelo para que o país supere a Lava Jato e comece a andar.
Na semana passada, o Ministério da Fazenda estimou em dois pontos o efeito da Lava Jato e da redução de investimentos da Petrobras sobre o PIB (Produto Interno Bruto), devido à paralisação virtual de toda a cadeia do petróleo.
Durante o ano, Dilma Rousseff recebeu diversas sugestões para resolver a questão da Lava Jato sem paralisar a economia. Todas elas em uma direção absolutamente legítima: penalizar os controladores preservando as empresas.
Ou seja, acordos que contemplassem multas e indenizações pesadas para os controladores das companhias. Para pagar, eles teriam que vender parte ou a totalidade do seu capital. O dinheiro recebido serviria para quitar as pendências decorrentes do acordo, sem afetar o caixa da empresa.
O próximo passo da crise do petróleo será nos portfolios dos bancos, às voltas com inadimplências gigantescas. E a presidente não mostra nenhuma estratégia em relação a um ponto crucial.
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No evento da Carta Capital, dois economistas com visões distintas cobravam o mesmo: decisões que mostrassem ao país que a presidente voltou ao jogo econômico. Delfim Netto pedia desvinculações orçamentárias e medidas na área da Previdência; Luiz Gonzaga Belluzzo pedia uma política monetária mais flexível, posto que a atual é suicida. E ambos concordavam que, sem acenar para perspectivas de crescimento, a presidente não conseguiria sair do lugar.
Delfim criticou pesadamente as interpretações dadas às pedaladas. Sustentou que todos os governantes recorrem a tal prática e que não há o menor sentido em criminalizá-la.
Não haverá impeachment porque o país amadureceu e não permitirá golpes. A democracia exige que Dilma Rousseff seja suportada até o último dia. Caberá à presidente definir a maneira como isso ocorrerá: se com um mínimo de cenário positivo pela frente ou com o profundo desânimo que caracteriza a perspectiva futura de seu governo.
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